quarta-feira, 18 de outubro de 2023

JAIR E LUÍS

Era uma vez dois meninos do mato,

Que moravam num sítio

Atrás de uma biboca;

Um arrancava palmito,

O outro, mandioca.


 

Um era de Glicério

E foi estudar em Eldorado,

Outro, de Garanhuns,

De caminhão foi pra São Paulo.


 

Um viveu entre quilombolas e guerrilheiros de esquerda,

Outro entre coronéis e donos de fábrica de aço.

Um sonhava com planos grandiloquentes de guerra,

Outro com greves, discursos e panelaços.


 

Um sonhava em não trabalhar mais marchando,

Outro sonhava em não trabalhar mais na linha de produção.

Os dois conseguiram virar deputados ensebando,

Sorvendo prazeres às custas da nação.


 

Um se arvorou em defender policiais, militares, padres e pastores;

O outro em defender operários, camponeses, discriminados, professores;

Mas o que seus asseclas ingênuos não percebiam

É que só a si mesmos eles satisfaziam.



Um foi preso por soltar uma bomba no Exército;

O outro foi preso pela Ditadura e pelo Moro;

Mas eram anjos na opinião de seu séquito

E quem discordasse entrava no couro!


 

Um com nome de salvador sagrado,

Outro com nome de molusco,

Envolveram corações nos tentáculos da idolatria

E cagaram uma nação que já há muito se contorcia.


 

Um gostava de jóias árabes, leite condensado e rachadinhas,

Outro, de triplex, pedalinhos, empreiteiras e caipirinhas.

Um odiava tomar vacina, tratar de emas e veados,

Outro odiava o capital, mas só o dos não cooptados.

 


Os dois provaram ao mundo

A dominação carismática de Max Weber

E jogaram num buraco bem fundo

A Suprema Corte de Rosa Weber,

 


Pois lá trabalha um careca soturno

Que fodeu com o primeiro,

E lá já trabalhou um negão sobranceiro

Que fodeu com o segundo.

 


E depois que todos foram traídos

E os dois aprenderam a agir como putas

(ou melhor, como rufiões combalidos),

O cinismo já tornara as esperanças mudas.

 


Popularidade baixa, os extremos se igualam,

E o começo do século vinte e um

Tanto ao começo do século vinte se compara,

Caricaturas de mau gosto num cartoon...


 

Aí estão os dois moleques bobos

Brincando de aparecer nos palquinhos

Enquanto se engalfinham seus amiguinhos tolos

Ficando cada vez mais ferrados e mesquinhos.