terça-feira, 25 de agosto de 2015

BILLY GRAHAM


William, o expansivo menino caipira.
William, na fazenda leiteira da Carolina do Norte.
William, que fugia da Igreja, levando o pai à ira.
William, sem qualquer intelecto especial, perdido e sem norte.


Terminou o Ensino Médio,
Largou uma faculdade no meio.
Seu professor lhe disse que ele nunca seria nada.
No que ele mesmo acreditou por certo tempo.


Mas os sermões de Mordecai Ham,
As tardes no campo com a Bíblia nas mãos,
Os salmos do pastor Davi em sua pobreza bucólica,
Os pecados arrependidos do agora rei Davi
Em sua teodiceia confusa – mas heroica,
O Evangelho do Senhor anunciado às nações,
As viagens de Paulo, as visões de João,
Tudo em seu peito gritava que sua vocação
Seria diferente de tudo que o mundo vira
Em matéria de pregação!


Formou-se em Teologia, foi ordenado.
Casou-se com Ruth, filha de missionários.
Mas o que fazia sua simples diferença
Era como se colocara a serviço e a mandato,
Levando, como arauto do Rei, a dadivosa presença
Do perdão de Deus ao mais vil pecador...


Numa Inglaterra destroçada pela Guerra,
Numa América rebelde e secularizada,
Num Brasil idólatra e eternamente à espera,
Numa África do Sul racista e segregada,
Num Leste Europeu ateu, ditatorial e marxista,
Num Japão milenar, fechado e tradicionalista,
Numa China vermelha, desconfiada e ressentida,
Num planeta em convulsão de humanidade perdida...


A bilhões ele pregou, incansável,
Em estádios, rádios, televisões.
Aconselhou presidentes, sem se meter em política.
Ouvia a todos com amor, sem tecer críticas,
E aproximava extremos que se odiavam
Com seu shalom que até os maiores sábios escutavam.


Era amigo de Martin Luther King,
De Nixon, de Eisenhower, de Clinton,
Até ditadores sanguinários diziam sim
Aos seus pedidos de paz em Pyongyang!


Ele organizou o Pacto de Lausanne,
Em que os evangélicos declararam seus comuns pontos de fé
E deixaram de lado diferenças históricas exangues
Para às correntezas se entretecerem em contramaré.


Discursou aos que choravam
O assassinato de Kennedy,
Os atentados do onze de setembro,
Os soldados mortos no Iraque, no Afeganistão,
Ou seus próprios caminhos estilhaçados em estradas de perdição.


Pregou aos presidiários, aos doentes terminais,
Aos excluídos, aos pobres e aos ricos,
Aos viciados, aos inimigos, aos iguais,
Porque via os homens desgraçados em rumos iníquos
Desesperadamente necessitados de perdão e salvação!


Era só por isso que todos o entendiam,
Porque o que tinha a dizer
Era tão-somente o que Deus tinha a nos trazer.


Suportou decepções, calúnias, difamações.
Perdeu sua bela Ruth, o afago sempre presente.
Sofre de Parkinson, pneumonia, câncer de próstata, osteoporose.
Por isso deixou ao filho Franklin os projetos ainda em mente
P’ra continuar a levar as boas-novas a um mundo em necrose.


Disse, em uma das últimas frases de sua lavra:
“Algum dia vocês ouvirão que Billy Graham está morto.
Não acreditem em uma só palavra!
Terei só mudado de endereço, sem temor:

Estarei desfrutando da comunhão do meu Senhor!”



segunda-feira, 24 de agosto de 2015

MADRE TERESA DE CALCUTÁ


Um amor condicional,
Uma felicidade circunstancial,
E vivemos todos ao nível dos cães!
Poucos servos, muitos capitães!

Co’a simplicidade de um Pai Nosso,
Co’a contemplação de uma Ave Maria,
Co’a convicção de um Credo Niceno,
Ela fez de chagas curadas sua romaria.

Agnes Gonxha Bojaxhiu,
Flor albanesa maltratada
Mais pelo sofrimento alheio que por si,
Pois que nesta nossa vida encarcerada,
Não parece mesmo a ti
Que todos levamos bocados de dor macerada?

Se Deus é Caridade,
Com que direito não o seríamos?
Se Cristo em Sua face de Verdade
Era o único a olhar aos cegos, aos leprosos e publicanos,
Com que prerrogativa nos isolaríamos?

A Santa das sarjetas, a doce avó dos miseráveis,
A enfermeira dos párias intocáveis,
A protetora das meretrizes mal arrancadas das bonecas,
O último rosto visto por moribundos de tez infecta.

Rosto cavado de rugas profundas,
De sol de trabalho, de lágrimas dos outros.
Rosto que chorava por quem ninguém mais chorava,
Mas que não perdia tempo com lamúrias – o que não ajudava,
Incomodava a doce senhora albanesa da Iugoslávia
Que inda menina era noviça de Nossa Senhora de Loreto,
Lá na Irlanda onde estudara o seu perfeito
Caminho que queria seguir desde criança
E raiar a todos sua tenaz esperança
De que um dia
O mundo todo seria
Um único coração a Deus oferecido em alegria!

Mas naquela escola ela se agoniava.
Fez-se enfermeira em Darjeeling,
E neste outro colégio também se incomodava
Com o repouso tranquilo de seus jardins,
Enquanto lá fora os pobres, aos milhares,
Nas calçadas, barracos, lixões, oficinas,
Contorciam-se em fome, doenças, isentos de olhares
De qualquer governo, casta ou Nações Unidas...

Andando pelas favelas de Calcutá,
Ela escolheu servir os que não podiam agradecer-lhe.
Distante de qualquer templo de Vishnu, de qualquer castelo de rajá,
Sem se importar com as moléstias que podiam transmitir-lhe,
Ela andava serena e pronta para acolher, mal tendo meios,
Pois a Divina Providência supre a todos os anseios,
Como Jesus já ensinara no Sermão do Monte
Aos seus embaixadores da paz, águas da Sua fonte...

Fundou a Ordem das Missionárias da Caridade
Perto de um templo de Kali, a deusa da morte.
Erguia albergues, escolas, hospitais pela cidade,
E por todo o mundo com as doações, vindas de Sul e de Norte.

No início, perseguida por muçulmanos e hindus,
Viu estes chamarem-lhe “Deusa da Misericórdia”,
“Face de Deus”, “Mãe dos Pobres”, e quão incomum
Era de fato tal amor nesta Terra hostil e sórdida!

Deram-lhe a Medalha do Senhor do Lótus na Índia,
Deram-lhe o Prêmio Nobel da Paz em Estocolmo,
Deram-lhe a Medalha Presidencial da Liberdade dos Estados Unidos,
E por fim seu carro fúnebre foi o mesmo do Patrono
Da independência da Índia, o Mahatma Gandhi,
Que por ser também uma alma grande,
Como tu foste, sem qualquer alarde,
Foi alvejado a tiros por um covarde...

Dizem que serás canonizada em breve.
Que o Vaticano espera ocasião oportuna
De proclamar ao mundo tua vocação nada leve
Que desempenhaste contra toda má fortuna,
Com singeleza de flor e persistência de felino,
Num mundo que nada sabe de amor tão cristalino.
Como se fosse necessária qualquer prova
De que vieste nos ensinar um pouco do que é o Céu
E nos humilhar em nossa egoísta cova

A qual cavamos, ignotamente, para nosso próprio labéu!




terça-feira, 4 de agosto de 2015

ÓSCAR ROMERO



Era um vilarejo humilde
Em Ciudad Barrios, El Salvador.
Uma terra que leva o nome do Senhor,
Mas onde todo mal incide...


Foi lá que Óscar Arnulfo nasceu,
E apesar de mui pobre, queria ser sacerdote.
Seu esforço a todo o adverso venceu
E ele galgava conquistas com um mote:
“Identificar-se com os pobres, sempre”.


Doutorou-se na Pontifícia Universidade Gregoriana,
Consagrado Arcebispo de San Salvador,
Escolhido justamente por seu conservadorismo que não inflama,
Numa época em que os ânimos prenunciavam o terror.


Mas se sua missão era de dar voz a quem não tinha,
Como calar-se aos desmandos da Junta Revolucionária de Governo,
À miséria cotidiana, renitente e vizinha,
Aos índios, camponeses e crianças alvejados por balas sem termo?


Aos desaparecidos, que chegariam a nove mil?
Aos assassinados, que chegariam a trinta mil?
À direita e à esquerda que se digladiavam em Guerra Civil,
Deixando mortos até nas escadas da igreja em que serviu?


Optou, como cristão, pela não-violência,
Como Martin Luther King, como o Mahatma Gandhi.
Não encontrou apoio no Vaticano, apenas complacência,
Um abraço de João Paulo II, pedidos de cautela e não levante.


Sabia então que estava sozinho com Deus,
Assim como seus amados pobres.
Teria que amar aqueles que ninguém amava como seus,
Sofrer-lhes as chagas, beber de seus odres.


Na homilia de 11 de novembro de 1977,
Inflamado de dor e piedade inconteste,
Clamou em alta voz contra o Perseguidor,
A infligir a suas ovelhas tais agonias
Que lhe não deixava outra possível expressão:
Em nome de Deus e desse povo sofredor,
Cujos lamentos sobem ao céu todos os dias,
Peço-lhes, suplico-lhes, ordeno-lhes: cessem a repressão!”


Quando o cristão se depara com a injustiça,Com a apostasia a Deus, com a tirania e a impiedade,Não há direita ou esquerda, nem ortodoxia mortiça,Não há Teologia da Libertação ou da Prosperidade!Há ação e oração, sal da terra, luz do mundo,Não fermento fariseu,Nem materialismo saduceu,Nem distanciamento essênio do restante dos hebreus,Mas comunhão e compaixão no seu sentido mais profundo!


Seu fim se traçava no coração do ditador,Enquanto torturas inundavam de gritos as delegacias,Enquanto um silêncio pesado se misturava a ondas de pavor,Enquanto inocentes pagavam o preço das ideologias.


Em 24 de março de 1980,Enquanto celebrava a missa,Um atirador de elite se apresenta,Qual Judas convencido de sua troca iníqua,E lhe dispara uma bala ao peito,Certeira no coração do eleitoPelo povo que lhe tinha apreçoE que inda não sabia ser este só o começoDe muito mais mortes e estertores

Numa guerra sempre sem vencedores.Não houve paz na TerraNem no dia de seu enterro:Atiradores, com mente de ódio e guerra,Invadiram o cemitério inteiroE dispararam contra aqueles a prantearPara lhes dar mais motivos para chorar!


Uma onda de protestos se levantou por toda parte.A ONU declarou o dia desse ato desumanoO Dia Internacional pelo Direito à Verdade
Acerca das Graves Violações dos Direitos Humanos.

A Abadia de Westminster, na Inglaterra,Mantém uma Galeria dos Mártires do Século XX,E ali, entre outras esculturas de face terna ou austera,Repousa a sua, como mais um lembrete triste,Ao lado de Dietrich Bonhoeffer, Martin Luther King,
Madre Elisabeth da Rússia, São Maximiliano Kolbe,E outros cuja memória não se extingueAo contrário da de seus algozes.


Quiseram calar-lhe a voz.Não o conseguiram.Sua beatificação foi aprovada por decreto do Papa Francisco,Que como se sabe, também enfrentou ditadores na Argentina,E optou pelos pobres, como o outro Francisco,Que há oito séculos também fez tremer sua Igreja em ruínas...


Portanto, quando vires teu mundo em confusão,Os fracos trucidados sem qualquer misericórdia,Lembra do teu Mestre que tanta atençãoDispensava aos exilados deste deserto de discórdia.