O
último mamute
caminha
com a certeza
de
que é o último de sua estirpe
em
meio à correnteza.
Vai
pesado e pesaroso
com
as patas aveludadas
pisando
solo pedregoso
devastando
as madrugadas.
Quando
dorme entre as geleiras
– mais
antigas do que ele em suas brancas veias –
o seu
sonho surreal
- muito antes de Dali -
- muito antes de Dali -
vê
ali rudes fileiras
de
sua família ancestral.
Vê
o último e tímido
dos
pequenos dinossauros,
vê
cavernas, icebergs,
desenhos
de minotauros.
Na
sua fantasia
a intocável
Medusa
é bailarina
obtusa
que
dança flamenco nua
como
num filme de Carlos Saura.
O
arcanjo Gabriel e a Morte
dançam
enlaçados um tango argentino
enquanto
sussurram a sua sorte
e
Cronos lhe afaga a tromba gélida,
empurrando-lhe
a face para mais ao norte.
O
último mamute acorda e pensa
de
quem herdara essa deserção da vida
e percebe
que a sua existência
foi
uma agenda não cumprida:
Domingo
ir ao último penhasco da Eurásia
ver
o nascer do sol que se abre.
Segunda
ir dizer umas poucas e boas
para
o tigre-dente-de-sabre.
Terça
quarta quinta sexta
buscar
por raros novos pastos.
Sábado
finalmente ver a aurora boreal
e
dezenas de novos tipos de pássaros...
Não,
nada,
sempre
essa expectativa naufragada:
acabara
o que não foi.
O
último mamute
caminha
e hesita
debaixo
dos pelos
que
a neve atrita
e sente
o peso
das
eras infinitas.
Entre
os brancos de marfim
com
uma língua ressecada
ele
liberta o derradeiro urro
de
toda uma manada.
Quando
lhe encontraram a carcaça
Osso-pedra
Couro putrefato
Inútil caça,
Não
lhe imaginaram os milhões de passos dados
Nem
fizeram caso dos olhos vidrados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário