Órfão aos 10 anos, criado pelo irmão,
Debruçado
ao órgão, ao cravo, ao violino,
Na
igrejinha luterana, os joelhos em oração,
Ou
– sua maior e tresloucada devoção –
Dos
dedos-raízes às teclas,
Das
cordas-carícias aos hinos,
Dos
ouvidos atentos aos anjos sibilinos.
Casado
co’a prima Maria Bárbara: sete filhos;
Viúvo
aos 35, casado com Anna Magdalena,
Com
metade da sua idade: treze filhos;
Em
meio aos choros e cueiros, o tinteiro e a pena,
A
despensa é efêmera, mas o talento é perene:
Haja
paciência, haja dinheiro, haja pênis!
O
duque Wilhelm não lhe dá valor,
O
príncipe Leopold sim, mas paga menos,
O
conde Hermann sofria de insônia:
Só
sua música lhe devolvia nervos amenos.
Ninguém
sabia ainda que o prodígio da Saxônia
Traria
ao mundo a Tocata e Fuga em Ré Menor,
A Paixão Segundo São
Mateus,
a Ária na corda Sol,
Jesus Alegria dos
Homens,
o Cravo Bem-Temperado,
Os
Concertos de Brandenburgo, o Minueto em Si Bemol.
Morreu
cego, mereceu uma nota de rodapé num jornal.
Ficou
esquecido até Mendelssohn trazer-lhe à luz do dia,
Mais
de um século depois, num festival.
Se
não, conheceríamos sua harmonia
Que
fundou os princípios tonais da música ocidental?
Quantos
aprenderam, canhestros, o piano
No
Pequeno Livro de Anna Magdalena Bach?
E
não disse o filósofo amargo e poeta ateu
Emil
Ciorán, que odiava a todos e a Deus,
Que
a única coisa que amava no Cristianismo
Era
a música de Johann Sebastian Bach?
Se
queres uma prece sincera em forma de música,
Se
queres conhecer o êxtase em empírea acústica,
Tenta
ouvir calado o humano trinado do Mestre de Eisenbach!
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