É
o filho de Dona Cândida, o filho de Manoel,
Entregue-lhe
a batina, o amito, a estola,
a
alva, o cíngulo, a casula, este terço, este anel,
que
ele será sacerdote que fará história.
É
inteligente, é bom, foi criado
por
tio-avô também padre,
já
sabia a mãe que seria abençoado
tão
logo rompeu a madre.
Mas
veja que ele gosta demais da Bíblia,
e
estão a chamá-lo de “padre protestante”...
Ele
literalmente “não tem papas na língua”
e
prega como um Savonarola beligerante!
O
bispo Dom Andrade está preocupado sobremaneira:
O
que fazer para que mude a ideologia torta?
Transferi-lo
a Piracicaba, Monte-Mor, Limeira,
Taubaté,
Ubatuba, Santa Bárbara ou Brotas?
Diga-lhe
para voltar a usar o escapulário
para
escapar no último dia ao Purgatório,
a
usar a medalha milagrosa de Catarina Labouré,
o
Código de Direito Canônico, a permissão da Santa Sé,
que
se conforme à milenar liturgia,
que
defenda a Imaculada Conceição
como
Bernadette Soubirous,
que
clame a Santa Rita no dia de agonia,
que
tenha por São Jorge especial devoção,
que
beije as relíquias que Roma aprovou.
Quem
ele pensa que é?
Que
quer seguir um cristianismo
só
prestando atenção ao Cristo
e
a mais nada que lhe mande o arcebispo
e
nem mesmo o Papa Gregório?
Pois
que tivesse proceder mais meritório
a
fim de passar menos tempo no Purgatório
e
merecer a bem-aventurança eterna,
bem
cimentada em obras e piedosas rezas!
Mas
ele não se emendou,
e
ainda passou a ter com presbiterianos,
conversava
por horas com o Reverendo Blackford,
e
foi este que o batizou.
Ele
viu seu primeiro culto entre paulistanos
e
cantou hinos de Spafford.
Professou
sua fé agora com mais coragem,
já
sabendo que de Roma lhe viria a voragem
a
tentar tragar sua novel mensagem.
Em
1865, num claro domingo,
depois
de pregar em Lucas 4.18-19,
sentindo
um renovar infindo,
que
finalmente sua alma absorve,
expõe
em um sermão exaltado
sobre
o ungido do Senhor pra curar os quebrantados.
E
logo depois, aprovado unanimemente pelo Conselho,
foi
ordenado o primeiro pastor brasileiro!
Percorreu
a pé, de novo, todas as cidades
que
percorrera como padre na mocidade,
a
pregar agora, como pastor,
o
Evangelho que toda a vida defendera com ardor.
Era
um Saulo caindo ao cavalo, atingido pelo fulgor,
Era
um Lutero entrando em guerra perigosa.
Estrondava
a já esperada manifestação de furor,
que
prenunciava o recolher da mão obsequiosa.
Os
jornais publicaram sua sentença de excomunhão.
Em
Pindamonhangaba foi insultado.
Em
outra fazenda, o dono lhe pôs a perseguir um cão.
Em
Campanha foi apedrejado
e
deixado quase morto ao chão.
Nômade,
andarilho, vivendo de pequenos serviços.
Perto
de Piraí, foi preso como indigente.
Liberto,
caminhou ao Rio, em busca dos amigos,
Mas
caiu, à beira da estrada, sofrendo gravemente.
No
hospital, recebeu roupas novas, um ralo caldo,
falava
pouco, queria estar a sós com o Senhor.
Será
que pensava em suas escolhas, e em seu saldo?
Em
quantas almas levara a Deus, se aprendera o vero amor?
Já
na manhã seguinte o encontraram morto,
enquanto
dormia, despertou no Céu.
Sua
alma sequiosa encontrava porto
e
seu corpo encontrou digno mausoléu:
Depois
de três anos do primeiro enterro
foi
trasladado ao Cemitério dos Protestantes,
ao
lado de Simonton, o pioneiro,
sua
lápide aponta para a glória dos triunfantes.
Deveríamos
nos lembrar desses pés incansáveis
e
continuar a jogar sementes nos montes e nos vales...
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