segunda-feira, 4 de maio de 2015

MARIA GORETTI


Você ouviu os gritos? Ouviu o choro
de corça assustada, de menina escondida,
que já sofre feito mulher a tragédia em coro,
com milhões de outras tantas no solo da vida?

A menina só tem onze anos,
tem a beleza cândida da pureza,
tem mãozinhas co’as marcas da pobreza,
E cuida dos irmãozinhos tão lhanos.

Luigi, o pai, morreu de malária.
Assunta, a mãe, ficou com os filhos.
A família perdeu a fazenda de que era proprietária
E foi obrigada a lavrar para os vizinhos.

Mudaram-se para La Cascina Antica,
em companhia da família Serenelli,
a qual nada lhes trouxe de serenidade amiga,
mas antes, uma tragédia que se repele.

A cada dia, o rapaz Alessandro,
então com vinte anos completos,
enxergando na menina a mulher que se formava,
ardia em desejos insanos e indiscretos.

Pelos caminhos dos campos, pelos cômodos da casa,
Assediava insistente a criança que fugia,
e o amor em leves chamas se fazia em ódio em brasa,
a tomar-lhe o espírito em púrpura agonia.

Com rubras faces de paixão animalesca,
o rapaz invade a casa portando adaga,
e a menina, que lhe resiste à libido grotesca,
larga as linhas de costura e reza tristes palavras.

“Que te passa pela cabeça? Quereis o inferno?
Ofendes a teu Deus! Manchas-te de pecado hediondo!”,
mas ele a nada ouvia, como se alma, enregelada de inverno,
Estivesse surda por demoníaco estrondo...

Não conseguindo atingir o carnal intento,
ele a apunhala por onze vezes.
Ela se arrasta até a porta, em abundante sangramento,
para levar outras facadas, por mais três vezes.

Quando finalmente a encontraram caída ao chão,
ela lembrava a virgem Santa Inês, ou Santa Cecília, em suas comoções,
e os médicos se surpreendiam de ainda lhe bater o coração,
tendo lesões na garganta, no diafragma, no peritônio e nos pulmões.

Ela ainda viveu por mais vinte horas,
a tempo de dizer que perdoava seu agressor.
Ele foi condenado a trinta anos de prisão, sem demora,
e o povo queria linchá-lo, em furioso clamor.

Enquanto cumpria pena, Maria lhe apareceu em sonho,
e lhe entregou flores, que em suas mãos se queimavam.
Em outro sonho ela lhe teria dito: “Se eu já te perdoei,
Por que tu não te perdoas?”, e seus olhos marejavam...

Quando foi libertado e seguiu seu caminho,
Alessandro pediu perdão à mãe da menina,
ingressou no Convento dos Frades Menores Capuchinhos
E ali serviu, como porteiro e jardineiro, até o fim da sua vida.

Ainda em vida, ao lado de Assunta,
ele assistiu à missa de canonização da menina,
proclamada santa pelo Papa Pio XII,
personificação de castidade, perdão e dignidade feminina.

Quando saiu da Basílica de São Pedro, à praça multitudinária,
o Papa perguntou a meio milhão de jovens que ali tinham orado,
se estes pretendiam lutar pela castidade enquanto necessária
e pela bênção da sexualidade sadia e vivida do modo adequado.

A resposta foi um sonoro “sim!”, que esperamos verdadeira,
especialmente em tempos de banalização do que é belo e sagrado,
em tempos de prostituição do corpo e do espírito, sem eira nem beira,
a alma se entrega à escravidão dos sentidos e do idolatrado.

Em tempos de abuso, de exploração, de pedofilia crescente,
que essa mensagem, infelizmente não única neste mundo,
seja um pequeno farol, ainda que triste e tremeluzente,
a lembrar que o pecado é mais terrível do que se pensa,
e leva o ser humano ao mais escuro do profundo!






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