segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O Dia do Julgamento

“We walk toward desire,
Hand and hand
Through fields of fire,
With only love to light the way
On the road to Judgement Day”.

“Judgement Day” – David Coverdale/Adrian Vandenberg


            Todos correm pra lá e pra cá
            Rezam hipocritamente para o Deus que renegaram
            Pagam o último dízimo e a última promessa
            Arrastam os bêbados para as instituições de caridade
            Os mendigos lotaram seus chapéus de moedas
            Deus lhes pague pela esmola
            Antes que morram!
            E se puderem gastar o dinheiro!
            Os meteoros nos lembram um cataclisma nuclear
            E um cartaz de Einstein, com uma língua flácida
            Pedindo o desarmamento
            Temendo a ira do mundo no seu esgotamento

Castre-se se foi adepto da luxúria!
            O profeta lunático vem queimá-lo vivo
            Em nome da Igreja em chamas
            Ruindo desde séculos!
            Queime os títulos e cédulas falsas!
            Queime as cartas dos amigos corruptos
            E as provas da sonegação fiscal
            Se foi adepto da cobiça!
            Vomite o que digeriu
            Porque alguém tem fome!
            Corra ao Judiciário
            Porque alguém no Serviço de Proteção ao Crédito sujou seu nome!

            Todos se espancam a todo lugar
            Matam-se num engarrafamento
            Sistemas nervosos centrais esgotados
            Narcóticos cegando organismos saturados!
            Tantas foram as guerras...
            Mas esta é a maior!
            Um canto do mundo explodiu
            Os estilhaços chegaram até aqui!

            O progresso de Juscelino não deu certo
            Os direitos trabalhistas de Getúlio não salvaram
            A mensagem de paz de Gandhi não tocou
            A luta de Mandela não aniquilou a miséria
            O apartheid é lei do mundo
            Segregação em cada segmento da hierarquia
            A propaganda é uma panacéia universal
            O capitalismo começa a ruir!
            O desemprego tecnológico de Marx
            Não é mais doença
            É sintoma crônico do final dos tempos!
            A multidão de vagabundos
            Da mão-de-obra ociosa
            Preocupação de Keynes
            Torna-se o mal absoluto
            De tempos de violência pela sobrevivência!
            Uma peste de ratos devora carne humana
            E espalha a peste bubônica
            A distribuição de alimentos entra em colapso
            Os vírus estão em constante mutação
            Os glóbulos estão doentes
            A Terra em franca decadência
            Por filhos que cortam as veias da própria mãe!
            Por inquilinos que enlameiam a própria casa!
            Roubaram a coroa do rei
            Fundiram e venderam o ouro em barras!

            Quem é lenda?

            De Gaulle está morto!
            Churchill está morto!
            Nasser está morto!
            Indira está morta!
            Golda Meir está morta!
            Hitler está morto!
            Tancredo está morto!
            Cabral está morto!
            O Brasil está morto!
            O mundo inteiro está morto!
            Eu estou morto!
            E Nietzsche disse que Deus está morto!
            Quem é lenda?

            Freud disse que a religião é neurose universal
            A música para dançar embala quebra-paus primitivos
            Vamos nos divertir na noite das putas e dos loucos!
            Vamos pintar um quadro com arranha-céus!
            Vamos lutar num ringue esburacado
            Para nocautear um faminto mais raquítico do que nós!

            “O fim está próximo!
            Ajoelha-te, infeliz!
            Ajoelha-te, pobre pecador mortal
            E começa agora a rezar”.

            E então o filho pródigo rezou:  

            “Deus perdoe os macacos que começaram a xingar!
            Deus perdoe os faraós que se ornavam com ouro!
            Deus perdoe os gregos libidinosos!
Deus perdoe os estupradores do Império Romano!
            Deus perdoe os cavaleiros genocidas e
            Os clérigos corruptos da Idade Média!
            Deus perdoe a ira dos samurais
            E a tirania dos xóguns no antigo Japão!
            Deus perdoe as grandes navegações
            E os artefatos inventados pelo homem!
            Deus perdoe o colonialismo!
            Deus perdoe o escravismo
            E o mercantilismo
            E o imperialismo
            E o capitalismo!
            Deus perdoe os europeus da nobreza facínora
            De tantos séculos,
            Suas perucas enormes, suas aulas de cravo e de violino!
            Deus perdoe os detentores do capital
            Que esmagavam com suas máquinas
            Jovens párias inocentes
            E construíam sua aristocracia!
            Deus perdoe os proletários fatigados
            E seus rostos sujos de graxa
            E suas vilas operárias imundas
            E a revolução industrial!
            Deus perdoe a construção da civilização moderna!
            Deus perdoe os bens de capital e os bens de produção!
            Deus perdoe a lei falha dos homens,
            Tão parecida com a lei das selvas!
            E os agiotas
            E o atraso cultural!
            Deus perdoe a revolução sangrenta
            E a ditadura comunista!
            Deus perdoe a burguesia do capital
            E a opressão do político general!
            Deus perdoe as Primeiras e Segundas Intentonas
            E os Terceiros Reichs
            E as Quartas Divisões de Infantaria
            E os quintos dos infernos!
            Deus perdoe meus watts e joules
            Gastos para o prazer
            Enquanto minhas células
            Realizavam trabalho, armazenavam energia
            Em suas engrenagens, polias e carburadores de gel
            Até que meus órgãos se esgotem por completo
            No dia em que não conseguir mais respirar
            Ou quando fizer jorrar sangue, meu combustível púrpuro,
            De transporte, cor de carne delgada,
            E fico pensando nessas coisas
            Enquanto procuro separar os pertences da alma
            E as posses do corpo
            Diluídos no mesmo ácido que habita meu estômago
            E tento saber o que sou
            Por meio de cálculos matemáticos
            E filosofia de botequim!
            Deus perdoe os incidentes terroristas!
            Deus perdoe o fanatismo cego!
            Deus perdoe as rivalidades, diferenças e conflitos!
            Deus perdoe o próprio Apocalipse que escolhemos!”

            “Levanta-te então porque teus joelhos sangram
            E saibas que não adianta comprar uma estátua
            Do meu filho que morreu por ti
            Porque Jesus Cristo descansa em paz ao meu lado!
            E não há terra prometida de Canaã para onde
            Moisés, Abraão, Jacó ou Raquel possam levá-lo!

            Com os mercados comuns mundiais
            E esperanças de riqueza nas Américas
            Não adianta ressuscitar Che Guevara
            Nem Fidel
            Porque eles não virão te salvar!
            Os últimos herdeiros do Kremlin
            Lutam solitários e angustiados
            Perdem as memórias a cada dia
            De Engels, Lênin, Trotsky, Stálin,
            Kruschev, Brezhnev, Tito e Gorbachev,
            Até só restarem as fotos dos jornais de ontem
            Com um Nureiev bailando e desertando
            E um Bóris Yeltsin abatido pela vodka,
            Jornais esses que agora recobrem
            A cabaninha de um miserável em Moscou!
            Mas a Guerra Fria morreu!
            Morreu Júlio César!
            Morreu Alexandre
            E Péricles
            E Carlos Magno
            E Átila
            E Arthur
            E Ivan, o terrível
            E Napoleão Bonaparte também!

            Então eu me lembrarei triste
            Dos humanos que criei
            Seus homens foram fortes e grandes
            As mulheres belas e alegres, joviais
            Houve sábios e guerreiros ilustres
            Inventaram coisas como só Eu podia
            Aqui no Éden...

            Dei-lhes o mundo!
            Mas meus filhos me viraram as costas
            E os irmãos se mataram entre si!
            Agora Eu mesmo vou poupá-los
            De viverem aterrorizados
            Num inferno improvisado
           
            A Criação gemeu e pediu
            Para que não vissem o verdadeiro Inferno
            Que nem o meu caçula Lúcifer
            Seria capaz de conceber...”

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