terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Poemas Aos Amigos (2006)

A Débora Zanini

Débora
“Abelha” significa em hebraico
E de fato és doce
E possuis um profundo olhar arcaico.

Constróis com teus projetos sem fim
A arquitetura da Bíblia para crianças
E tecendo figurinos e cenários assim
Constróis nestes pequenos o valor sagrado da esperança.


A Josafá Veloso

Inequivocamente és gênio e daqueles tempestuosos
Que invertem a ordem do mundo
Para transformá-lo em quadros impressionistas e formosos
Feito melancólica película de première do submundo.

Jamais deixarás a crítica detalhista
E a angústia que só os sábios conhecem
E tu’alma, que além de cristã é artista,
Conhece a metafísica que os teólogos desconhecem.
Tal acontece nos filmes que destrinchas,
Tocas ao violino a sonata tétrica,
E olhando impassível dos píncaros da vida
Sabes que apenas Era Uma Vez na América...

Por isso não deixas de falar às reuniões plenárias,
De teimar em ser humanista em meio aos teocêntricos,
Nem temes em levantar bandeiras várias
Se a revolução é contra corações egocêntricos.

Não deixas.
Não desistes.
Não temes.
E nem deves.


A Eduardo Gonçalves

Eduardo,
Sabes ensinar a seriedade de Abraão,
Com trejeitos de Jim Morrison,
A trilha sonora do Dream Theater
E uma inefável serenidade de coração.


A Fábio Gonçalves

No mesmo clã dos Gonçalves,
Segues os passos do caminho eterno
E já pareces um sábio grego, velho Biúfa,
Em plena adolescência – alvor antes do inverno.

Tivesse eu o privilégio tamanho
De conhecer a arte do equilíbrio
Nesta idade em que tive cérebro tão tacanho,
Injetado de hormônios pueris e desesperanças senis,
Num espírito híbrido...
Todavia, inda que a puberdade te dê a ilusão de invulnerabilidade,
Ouve o conselho da experiência, sem demora:
Fica longe do grave e sisudo mundo jurídico
E dessas bandas de rock de agora.


Ao servo de Deus, Raimundo Cleve

Já disse Drummond
Que se chamar Raimundo num vasto mundo
É uma rima e não uma solução.

Mas tu conheces a solução
E foste estudar para falar da salvação
A um povo de pétreo coração.
Tens a força que Euclides da Cunha já atribuía ao sertanejo,
Em tua persistência nos áridos caminhos da vida,
E guardas, incólume, a simplicidade dos tempos do velho Maranhão,
Onde aprendeste teu caráter e tua fibra.

Em tuas conversas, seja sobre o instituto bíblico,
Sobre as aulas do seminário,
Sobre os jovens da igreja,
Sobre nosso parco salário,

O que restava, sempre, ao final,
Era uma sensação de paz
Que tão bem transmitias, afinal,
Pelo que Deus fez em tua vida pertinaz.

Amigo de tantas horas,
Que o Espírito capacitou em vero amor,
Oro para que sejas Seu mensageiro sempre,
E como nasceste para ser – um verdadeiro pastor!

Ao Reverendo Márcio Alonso

Nos campos em que escolheste lutar,
(Ou a que foste conduzido para tanto),
Não há lugar para caças e pilotos pelo ar,
Tampouco haverá trincheiras nalgum canto.

A batalha será invisível, sutil e diária,
Será celeste, diluída e vária;
A batalha será entre o áspero intelecto de Calvino
E o nobre coração dos Wesley;
Será a batalha interna como a de Agostinho
E mundial como a de William Carrey.

Entristecer-te-ás como Elias,
Decepcionar-te-ás com teus discípulos, como Eliseu.
Às vezes só, como Jeremias,
Às vezes inconformado, como Ageu.
Mas inda que o mundo em mar revolto se torne
E inda que não seja fácil instar um povo à caminhada,
Auxiliaste-me a compreender que a nobreza provém do espírito
E que a verdadeira sabedoria flui tão-somente do Santo Espírito.

Auxiliaste-me, e não te vi distante como na cátedra dos clérigos,
Mas sim como um amigo, que em certos pontos tinha face de espelho.
Conheceste de fato em mim limitações e deméritos,
Todavia, soubeste cumprir teu ofício aarônico com desvelo.

Ambos lidamos com palavras e textos dispersos:
Tu, com o responsabilíssimo veículo da Verdade,
E eu, como a ilusão efêmera dos versos perversos,
Única expressão viável da hermenêutica de minha mortalidade.

E inda que os estertores d’alma me confundam os rumos,
E que a Graça ainda louvor não me empreste,
Não é pelo fato de eu não ser bom aluno
Que se lhe retira o inequívoco título de mestre!


À Dra. Ângela Nojiri

Ângela, sabes que quando me conheceste
Eu era um homem de face inerte,
Desses em que nem o humor nem a natureza são bons,
Desses que só enxergam os dias se acumulando em negros tons.
No dia-a-dia do escritório, todavia,
Aprendi a pedir teus conselhos, toda vez,
À sabia voz da vivência, que comigo dividia
A árdua lida da advocacia por mil e poucos reais por mês.

E conheci em ti a serenidade
Que encarou o que é amargo de forma diferente da minha,
A serenidade que não vem apenas de teus antepassados orientais,
Nem de teu espírito guerreiro nipônico,
Mas da própria grandiosidade de tua alma,
Alma sólida como mármore jônico.

Sabias rir mesmo em meio às pressões,
Aos prazos, diligências e petições,
Deste túmulo de vivos irredimível
Que se chama contencioso cível.
Robert Plant
Dizia com voz renitente:
Sometimes I grow so tired...
But I know I’ve got one thing I got to do...

Mas então, levantando a fronte às nuvens novas,
Nos lembramos de que há bons kamis na mitologia shintô,
Como tu, amiga, que merecias um hai-kai de rosas,
E, por tudo, arigatô.

À Dra. Juliana Ramalho

Senhora Doutora do Direito Trabalhista,
Que num contraste imenso com essa rotina insana
De reclamações, pontos, adicionais e encargos sociais,
Consegues preencher teu mundo com a poesia humana.

Para meu privilégio, trabalhas defronte à minha mesa,
E enfeitas este lugar com um refinamento quase germânico,
O refinamento do próprio espírito, só comum aos que amam os livros,
Aos que extraem do uníssono trivial o etéreo cântico.
Com delicadeza de lírio, com estilo próprio,
Adicionas à insalubridade um fundo de garantia de afetos,
O aviso prévio da candura mística
E as horas extras de contemplação lírica.

Dra. sui generis,
(Pois ter estilo é ter coragem
E força de caráter...)

Por amar a poesia fizeste poesia de ti mesma,
Como se a ouvíssemos dos lábios de Goethe,
Das lágrimas de Heine, do ímpeto de Schiller,
De um leit-motiv de Wagner ou do Liebesträume de Liszt,
Do cinza e ocre de Berlim,
Ou donde o sonho encontra o efêmero
E se fundem num fim.
Não sei se esqueceste o idioma alemão que amara,
Mas parece que dele algo ficou em ti,
Não com a frieza histórica de prussianas venturas,
Mas com o que de mais elevado se retira daqui:
A edelweissblume que se colhe de Alpes rochosos,
A pétala afável da lembrança que se leva desse mundo.

É o que eu levo de ti, amiga,
Junto ao canto dos pássaros
E o cristal da chuva.


Ao poeta Octávio Roggiero Neto

Saudoso amigo,
Colega de labuta – jurídica e parnasiana,
Filho de poeta, neto de desembargador,
Atingido mortalmente pela beleza
(Essa transcendente dor)!

Quantas vezes não nos desentendemos
Desde os tempos sonhadores de colégio
Por aquela escola literária que íamos fundar
E não fundamos.
Por aquela humanidade que íamos transformar
E não transformamos!

Eu, com minha prolixidade e verborragia,
Tu, com teu poema lapidado e sucinto.
Eu, com meu misticismo e peregrinação espiritual,
Tu, com teu então espírito agnóstico em cético labirinto.

De fato, crescemos e nos transmudamos,
Não sei bem se para melhor ou para pior,
Mas mesmo distante, inda percebo uma coisa:
A essência de poeta, que é sempre a mesma.

Só tu podias enxergar no caos da cidade
O vira-latinha de olhar chaplinesco,
O ratinho comovente nos trilhos da estação,
E a placa de trânsito inusitada e tão necessária:
“Facilite o amor”.

“Poeta não sabe contar piada”;
“Com minhas mãos de ausência(...) lhe dei o meu último adeus”;
“Quando chega o frio, o tédio vem também”;
“Profeta, feto de Deus, poeta, inseto ou... eu?”

Lembro-me de tuas palavras,
Escritas ou faladas,
Recebi os convites para teus blogs poéticos
E escusei-me com covardes desanimadas.

É que nesses dias burocráticos,
Nessas “noites sem palavras”,
Mataram-me por dentro
E cobriram meu peito com flores macabras.


Ao Dr. Fábio de Souza

Prezado Doutor,
Encaminho-te a presente carta
Para marcarmos mais um daquele
Uísque, torta de frango e Sinatra.

Com agradabilíssimo bate-papo cabeça
Sobre os pareceres dos jurisconsultos,
Sobre os arcanos dos hierofantes
E os clássicos dos homens cultos.

E aquele papo sobre a vida,
Em que rimos de experiências
Dantes choradas, dantes amargas,
E assim refletimos sobre as ulteriores vivências.

De quebra, já parabenizo, agraciado,
Pelo apartamento bem mobiliado,
Pelo casamento cem por cento,
E pelo escritório em desenvolvimento.

Mereces tudo de bom, amigo,
Manda lembranças à Ana Flávia,
Escreve quando puder, o e-mail é o do remetente,
Ternos abraços, Carlos Vicente.

Ao Dr. Márcio Valentir

Ao mais promissor
Jovem advogado da Mooca:

Grande ser humano,
Grande camarada.
Nós temos a sorte
De sermos mackenzistas até a morte...

Boa sorte nos concursos,
Espero que figures num cargo público
Com a mesma competência que tens na esfera privada
E com o mesmo espírito íntegro e lúdico.

Até a próxima cerveja na Maria Antonia,
Ou na Consolação.
Conversaremos de novo sobre as mulheres que amamos
E sobre esperanças num mundo cão.

Amigos são poucos os que restam:
Da Faculdade, só tu restaste, Valentir.
Mas o que importa é que o tempo é peneira,
E só ele nos mostra com quem triunfo e tragédia podemos compartir!  






Um comentário:

  1. Amizade antiga que mesmo em distância nos abraça em Poesia. Alegria toda minha de pertencer ao grupo seleto, presenteado com tuas palavras. Que os idos de 2006 sejam os chegados de hoje... e sempre. Amém!

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