terça-feira, 18 de janeiro de 2011

O Fim de Orfeu (das "Canções de Orfeu")

Evoé.

É quando florescem os narcisos,
Que venho a vós com um astro na fronte,
Com serpentes enroladas nos braços,
Com o cetro de ébano, marfim e cristal,
No carro de cisnes de meu pai,
Entoando os hinos ao fogo,
Ao zênite inextinguível de Dioniso,
A soar os Sinos do Abismo,
A chorar o incompreensível das horas,
A planger as raízes das plantas,
A beber a seiva do deserto,
A incorporar o corifeu áspero das areias,
Dentro da tua solidão de gaivotas.
Despedaçado pelas bacantes,
Tomadas pelo ciúme de meu amor imortal,
O pescoço a jorrar rios de vinho,
A cabeça lançada ao Érebo,
Que mesmo decapitada não parava de chamar por Eurídice,
O espírito já despedaçado em vida,
Agora inteiro para migrar ao Hades,
Sobrevive em névoas sobre os píncaros,
Agarrado a mármores imemoriais,
Para solfejar pelos ventos do leste
As palavras aos poetas do mundo
– Esses sacerdotes de ramos mortais –

Evoé.

Se quiseres saber de minha triste história,
Lê sempre estes lampejos eternos
Do rosto claro e secreto de Eurídice
A ressurgir em cada fonema da fala,
E então meu nome renascerá em conluio
Como gotas da fonte do Parnaso
Que te ensinarão o que deves dizer.

Tu saberás quando eu me aproximar.       

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